“Dos escritos.”

Maria Eduarda Caldeira
2 min readApr 6, 2021

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Hoje, pude olhar para o horizonte. Foi algo breve, confesso. E lá estava eu, mergulhada em total curiosidade. No entanto, ao me debruçar no parapeito, senti coragem. Logo, ela preencheu todo o meu corpo. Senti também nostalgia, daqueles dias da infância em que tudo era muito mais tranquilo, longe do caos contemporâneo e de todas as maluquices que preenchem os dias atuais.

Eu acreditava no Papai Noel e na Fada do Dente, além disso, me debruçava com gosto nas fantasias que me cercavam. Gostava de colecionar gibis, bichinhos de pelúcia e dedilhar o piano da minha bisavó, sem que ela estivesse olhando, porém, ela sempre escutava e vinha ao meu encontro. Eu não sabia muita coisa, mas gostava de escutá-la tocando. Ela tentava me ensinar a tocar, mesmo eu sendo muito dispersa.

A vida talvez fosse mais simples. Talvez eu fosse mais simples. Ou apenas… talvez, eu fosse apenas uma criança.

Ora, é assim mesmo, de um jeito deveras inusitado que tudo vai acontecendo. É por isso que escrevo. E que bom que escrevo, pois logo recebo uma confirmação, talvez demasiadamente simplista, talvez um pouco sem sentido, porém, reconfortante para mim: a vida continua. E percebo que já vivenciei isso antes, ainda na infância.

A vida continuou, em algum momento, quando descobri que o Papai Noel não existia. Sim, eu senti frustração e um pouco de tristeza, embora sem saber distinguir meus sentimentos na época, desconhecendo nomes tão concretos.

Eu quis desistir do Natal, dos abraços, dos beijos e dos presentes. Mas descobri que não poderia. E o Natal continuou, ano após ano. Mesmo sem o Papai Noel.

A vida continuou, em algum momento, quando descobri que a Fada do Dente não existia. Novamente, eu senti meia dúzia de sentimentos, estava insatisfeita e confusa. Como não era uma Fada que trocava o meu dente por uma nota de dinheiro?

Eu quis fazer birra. E fiz birra, como uma criança. Eu não queria mais perder os meus dentes de leite. Mas descobri que não poderia.

E continuei perdendo os meus dentes. Mesmo sem a Fada.

E novamente, eu penso que tudo era mais simples, menos complexo. Meus medos eram outros, a vida era outra. Percebo que ainda não sei muita coisa, mesmo hoje, após tantas coisas terem acontecido.

Mas já enxergo que a vida continua, sim.

A vida continua, dia após dia, mesmo sem ter minha mãe por perto. Era ela quem exercia a função de Papai Noel e de Fada do Dente. Era ela quem segurava a minha mão na hora de dormir.

Por um momento, depois da sua partida, eu quis desistir de tudo.

Talvez, voltar a ser criança, fazer um bocado de birra.

Eu não queria aceitar.

Hoje, eu aceito. E continuo a travessia. Mesmo sem ela.

Sim, ainda há alguma tristeza, mesmo que eu já aceite a ausência.

E é por isso que eu preciso ter coragem, entende?

Sem coragem nada acontece. E a vida não continua.

Que bom que eu posso escolher continuar, ter coragem no dia de hoje e apreciar o horizonte.

É um alento, confesso.

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Maria Eduarda Caldeira

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